ACTIVISTAS - Cimeira da guerra.
História Ficcional
João Carlos Aguiar - 30 de Junho de 2014 - Lisboa, Portugal
Parte 2 de 6
Quartel
d@s Activistas
ACTIVISTAS - Cimeira da guerra.
História Ficcional
João Carlos Aguiar - 30 de Junho de 2014 - Lisboa, Portugal
Quartel d@s Activistas
O mês era de Setembro e o ano de 2010. Os primeiros a chegar a Lisboa vinham da Bélgica, numa antiga carrinha branca da popular e famosa marca Volkswagen. Eles eram extremamente afáveis e simpáticos. A An e o Bart, e a princípio estranhara logo por que vinham apenas duas pessoas. A explicação era simples e residia na carga que traziam consigo, onde se encontravam computadores, prospetos empilhados, posters ainda enrolados em tubos e ainda a cheirar a tinta da gráfica. Sempre pela paz e sempre contra a guerra, claro. Contudo, destes materiais todos, fixei-me em especial num enorme rolo de fita, do género dos separadores utilizados para demarcar as áreas de um crime pelas equipas forenses. Mas nesta fita estava inscrito em letras garrafais: NATO GAME OVER. As palavras repetiam-se vezes sem conta, naquele rolo interminável. O espírito das próximas horas vividas no seio dos e das activistas e durante toda a cimeira no Parque das Nações, iria ser exactamente esse. NATO, já chega de brincadeiras.
Fomos
directos para Xabregas, onde o Quartel Activista estava a ser
montado. E como prova do valor daquele campo, já por ali se
avistavam carros com indivíduos sozinhos de chapéu e óculos
escuros, sentados no seu interior, parados durante horas em frente ao
campo dos activistas. Várias vezes eu regressava a casa, e um desses
carros vinha atrás de mim. Desde o Braço de Prata em Marvila até
Sete Rios, Benfica. Não me parecia muito sinceramente que fosse
apenas uma coincidência. Ilegal, sim, lá isso era.
O
armazém de sete metros de altura e largas dezenas de metros de
comprimento, a poucos dias do início da cimeira, não sabia ainda o
seu destino. O grande portão metálico na entrada do galpão
separava o nosso mundo de valores e ideais, do calmo e recôndito
bairro do Poço do Bispo, na capital portuguesa. Às largas dezenas
de nós que lá chegaram naquele dia de Outono, juntaram-se outros
mais nos dias seguintes. Elas e eles vinham de toda a Europa. Da
Polónia, Holanda, França, Espanha, Itália e claro, de vários
pontos de Portugal. Os Serviços Secretos já sabiam da sua chegada.
Nós, portugueses já tínhamos também sido detectados.
As
fronteiras do país foram encerradas temporariamente e todas pessoas
tinham que apresentar um passaporte na fronteira, uma prática que
estava à margem da lei e contra o Acordo Schengen.
No mínimo, era revoltante que as polícias europeias pudessem agir
assim perante os seus cidadãos.
Vários grupos de activistas
ficaram retidos na fronteira de Elvas-Badajoz, e mandados de volta
para a sua proveniência. Como é que esta suposta organização NATO
quer defender e apregoar a paz, com estas atitudes de fechamento de
fronteiras, de bloqueio à circulação de pessoas, sempre à margem
de acordos internacionais? Que prepotência, insensatez, e que falta
de sensibilidade para governar, comandar ou planear o que quer que
seja.
OccupyMN - CC BY |
No
interior do nosso quartel, já cheirava a jantar. A equipa holandesa,
regressara de uma ronda pelo Beato e pelo Braço de Prata à procura
de alimentos reciclados do lixo e de restaurantes. Esta refeição
gratuita serviria para a centena de nós que ali pernoitava, nas
vésperas daquela cimeira que ia decidir os caminhos da guerra no
mundo, durante os próximos cinco anos.
Katerina,
polaca de trinta e poucos anos de idade, devota à causa pacifista
por uma boa parte da sua vida, circulava atarefada pelo corredor
principal do espaço, para ir repor o Manual do Activista na mesa de
informações, colocada logo por detrás da porta de entrada daquele
antigo armazém de torrefação de café. Tal como ela, éramos todos
voluntários. Junto à entrada no corredor, estava a denominada “Sala
de Trauma”, onde se podia a qualquer momento, conversar com alguém
licenciado em psicologia, sobre as experiências mais vincadas de um
dia de confrontos com a polícia, ou de interrogatórios judiciais.
Muitas vezes as batalhas não eram mais do que intimidatórias, frias
e psicológicas. Talvez isso explicasse a tamanha afluência que vi
àquele espaço de aconselhamento. Uma dezena de jovens, apenas no
primeiro dia de manifestações.
Além
do espaço que a equipa holandesa arrendara com o financiamento de
uma associação não governamental de Amesterdão, explorámos as
galerias infindáveis que se estendiam naquele complexo fabril que
ocupava todo o quarteirão do Braço de Prata. Com uma boa dose de
magia e suspense,
sempre se abria a passagem de umas salas para as outras. A antiga
fábrica de tomate enlatado conduzia a uma central eléctrica com um
enorme painel de controlo fabril de dois grandes manípulos e várias
luzes vermelhas de controlo. Os incontáveis tanques de processos
industriais, erguidos a dezenas de metros de altura, estavam todos
interligados por escadas de metal. Tudo isto era estanho e sinistro.
Ao passar pelos átrios, percebemos que já lá estiveram outros
antes de nós, pois levaram consigo o cobre.
O
rapaz que fazia escalada da equipa francesa, passou os cabos pelas
estruturas de ferro que aguentavam o tecto de zinco que nos cobria.
Eu ligava a tomada e fazia-se luz. Agora os computadores do teatro de
operações estavam ligados à internet.
A imprensa internacional aguardava expectante os mails
e telefonemas que lhes faríamos chegar ao longo dos próximos dias,
para divulgarem as nossos conquistas. O prato vegetariano estava
pronto, e logo seguia-se a Assembleia Geral de Activistas.
Continua...
Continua...
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"ACTIVISTAS - Cimeira da guerra."
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