sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Registo #1 - Partida de Lisboa até Marrocos

Chefchaouen, Marrocos
Estou maravilhado com os primeiros momentos da viagem. Maravilhado mas não ofuscado... espero!

Saí de casa há 3 dias e já tanto aconteceu, tanto aprendi. Viajar é conhecer o Mundo, sem dúvida, mas conheceres-te também a ti próprio. Parece-me ser assim, mas estou a dizer isto com apenas 3 dias de viagem, portanto não te fies muito neste
mancebo das viagens!

De metro fui até Sete Rios, onde apanhei o comboio até Foros da Amora. O objectivo e apanhar boleia na estacao de servico junto à A2. Ha cerca de 8 anos tinha ido à bomba com uma namorada e foi facil entrar. Desta vez havia vedaçao à volta! Como "tudo tem um fim", dizem os orientais, fui ate ao fim da vedaçao e andei para tras rumo à bomba, cerca de 1 km, junto à berma da apressada A2.

No meu estatuto de mancebo, fui abordando as pessoas, sem saber se bem, se mal... mas sempre tentando. Para aprender ha que errar... pois entao que venhem os erros! Veio tambem a sorte, e passados 15 minutos um casal espanhol de Cadiz: Sr. Juan e Sra. Ascension oferceram-me uma passagem directa ate ao sul de Espanha. Encantado fiquei com este casal espanhol que me deu a primeira ajuda durante a viagem. Correu tudo bem. Fomos "a abrir" pela A2 abaixo e depois pela Via do Infante a este. Paramos em Sevilha por uma hora, e chegamos pelas 19h a Cadiz.
Li em varios sitios na internet que e dificil andar de boleia em Espanha (o casal foi uma excepçao, nao me peguntes porquê!), pelo que tentei primeiro o autocarro para Tarifa, onde poderia embarcar no ferry rumo a Marrocos. "Lo Siento, solamiente hasta las 18h30. "Enveredei pelo plano B: "Autostop!"
Fui ate à bomba mais perto da saida de Cadiz para Tarifa mas, de facto, nao foi facil. Uma hora à espera, mas como "quem espera, sempre alcança", apareceu um anjo: a Patricia, que percebeu que eu estava em maus lençois, devido à escassez de alojamento durante o Carnaval de Cadiz, e decidiu por isso acolher-me. Vive com o seu "novio" (ou "cari", abreviatura de "carino", como ela o chamava), o Pablo, um "surfero" que à custa das ondas ja conhecia bem a costa portuguesa. Deram-me dormida, jantar, conversaçao, ligaçao à internet, pequeno-almoço, levaram-me à estaçao de autocarros e "rien a payer!" A Patricia explicou-me que a sua Avo esta muito doente e que em troca, apenas pede a Deus que ela melhore. Peço o mesmo pela minha!

Rumo a Tarifa, a ponta mais a Sul de Espanha! O autocarro foi barato e rapido. Cheguei à vila e rumei à pousada "Banti", onde o Flo, um alemao de 30 anos, membro da rede "Couchsurfing" me esperava. Pois e, fiquei numa pousada sem pagar e em regime de "Pensao Couchsurfing"! Este palavrao refere-se a uma rede de pessoas na internet que acolhem viajantes em suas casas a custo zero. Hei-de referir muitas mais vezes este anglicanismo por aqui... seguro! Mas atençao que so fiquei na pousada gratuitamente porque o Flo era o encarregado das obras de remodelaçao do "Banti".

Quando cheguei à pousada ofereci-me para cozinhar. Nao havia muito, portanto foi improvisar com o que havia. Fiz um refogado (ou "esturgido", à boa moda do Porto carago!), adicionei uns pimentos e caril, cozi massa, juntei queijo e manteiga, e preparei uma salada com azeite e oregaos. Foi o suficiente para impressionar o Flo e o Tom, um americano de 45 anos, com um invejavel curriculo de viagens e que vive agora em Tarifa, onde gere o seu negocio de um casino online. Muito boa gente, me parecem.
O Vento de Levante, do qual me recordo tao bem de ouvir falar nas aulas de historia, pos-se forte e acordou-me a meio da noite. No dia seguinte marchava rumo ao Porto de Tarifa para embarcar no barco para Tânger. Imaginei um pais diferente, mais distante, com gente mais diferente. Sem saber bem porquê, senti-me bem, perto de casa, ao pisar o solo marroquino. Deambulando uns minutos, sente-se o desalento e a ansiedade nas pessoas por uma vida melhor: o Sonho Europeu, que na minha humilde opiniao nao e realizado em Portugal ou Espanha, que nao me parecem ser muito diferentes de Marrocos. Tentei resistir aos taxis, mas, um pouco mais iluminado, decidi poupar as costas para uma grande viagem e pedi a um fogareiro para me levar ate à "Gare de Bus".

Enquanto esperava o autocarro, comecei a falar com um sabio senhor de 40 anos, Abdulah, que ate sabia que o Rei de Portugal se tinha exilado no Brasil. Entrei no autocarro, depois de prender a mochila com cadeado aos ferros do porao, nao va o Diabo tecê-las, e rumo a Chefchaouen, nas Montanhas do Rif! Chegado ja de noite, apareceu logo à saida do autocarro um "encaminhador de turistas" que me tentou levar a todo o lado menos onde eu tinha um amigo do Hospitality Club (rede semelhante ao Couch Surfing) à espera. No final ainda pediu dinheiro... por me ter feito gastar as costas e o tempo. Dei-lhe 6 Dirham (cerca de 50 cêntimos) e ja foi muita bondade! Enfim... aprendi a ter cuidado na saida dos autocarros.

Encontrei-me com o Zohair, amigo do HC a meio da semi-final da "Coup d'Afrique" Egipto - Costa do Marfim. Resultado final 4-1 para o Egipto, e Marrocos celebra a vitoria quase como se fosse sua. Afinal de contas, e um pais arabe que vai estar na final! Zohair e muito afavel, inteligente e com bons principios. Nao pôde acolher-me mas os seus amigos puderam, e ate me puseram na mao as chaves de sua casa! Esta pequena vila azul na montanha revela-se bela e hospitaleira.

Marhababekum! (Bem-vindo! em Arabe)


Música: Chambao - Papeles Mojados, Kruder & Dorfmeister - K&D sessions
Leitura: Lonely Planet - Marrocos